A parede nua e branca é o palco para diversos sonhos, imagens, divagações.
A mente poderosa e horrível do ser humano é capaz de criar castelos e destruí-los, inventar monstros e torná-los anjos, provocar batalhas e enredar romances. O silêncio quase tumular só é quebrado pelo tic-tac do relógio que não para, e também por longínquos sons que penetram as janelas sem vidro, anunciando que o planeta resiste, gritando que há vida. A fome está presente no organismo humano, porém o cansaço e o tédio impedem o famélico de ir atrás de comida.
O fatídico desejo da curiosidade humana em colocar-se onde jamais esteve provocou revoluções, ódios, construiu e destruiu cidades, devastou florestas e rios, singrou oceanos e encheu de lixo o planeta. E hoje, neste exato momento em que estão sendo escritas estas linhas vazias de quase tudo menos de tédio, a humanidade inteira respira apreensiva por não saber o que fazer com a tecnologia, brinquedo que criou para aprimorar seu prazer, mas que se voltou contra seu criador e agora, longe do controle outrora exercido pelos humanos, segue seu próprio caminho indefinido, fazendo de seu próprio pai o refém predileto.
É a vingança mortal dos filhos de Cronos, que envenenaram a própria carne e o próprio sangue, e com isso conseguiram devolver em terror a bestialidade que herdaram. A humanidade adoece, vítima de seu próprio remédio. A dor e a fatalidade não desapareceram, mas aumentaram seu grau de influência sobre a pobre e desconsolada raça humana.
Todo o passado de uma vida apenas, assim como todo o passado de toda a história humana, são incapazes de traduzir a emoção do desconhecido próximo segundo. Nenhum livro de escritor algum vale aquela página em branco que ficou por escrever, e que representa a efeméride, o transitório, o ilusório da vida sem sentido deste homem a quem faltou um segundo para continuar sua obra.
O ser humano é solitário, seus pares na humanidade são impotentes para trazê-lo um pouco de paz. Daí a origem da guerra, esta arte saneadora qeu edifica o alicerce transformador e renovador do pensamento humano.
A raça humana é a única em que a tristeza existe como característica inata.
Não há criança que não acorde do sonho infantil num mundo melancólico, violento e irascível. Não há mulher que não sinta suas dores com um tom resignado que inclui o prazer. Não há homem que não tema seu próprio desejo por sabê-lo transitório.
A linha em branco que ficou por ser escrita é a revelação da transitoriedade, e nem mesmo a mais poderosa e completa das ações humanas modificará esse ridículo quadro de mediocridade.
Por isso, propomos uma nova arte, uma nova estética, em que o olhar humano não esteja mais centrado no passado como construtor do futuro, mas no segundo exato em que o olhar e os gestos se fazem presentes. Isto por certo não trará fim à transitoriedade, mas olvidará o ser humano da condição de acusador-acusado por tantos erros históricos.
O Agora é uma droga imediata, que ao penetrar a veia atinge o cerne da loucura. Não nos importa o amanhã nem o ontem, não ligamos para a projeção. Queremos a paz e não nos importa mais sabê-la transitória, porque o presente não é transitório. Uma nova abordagem dos sentimentos criados pelo cérebro humano, não para torná0los qualquer coisa nova, mas para fazê-los já plenos de toda sua capacidade construtiva.
E hoje, mais do que nunca, a construção a que nos referimos é sempre virtual, imagística, sem forma, cor, letreiro, molde palpáveis, e sua prática é a única maneira de livrar a humanidade da desorientação a que ela mesma se faz vítima ao construir o mundo da simbologia.
O mundo dos sonhos pode finalmente libertar-se de sua prisão através da concepção artística possibilitada pelo imediato. E hoje, vê-se que os sonhos não eram tão diferentes assim da realidade, e que a realidade é relativa e maleável: pode ser manipulada, transformada, reciclada.
Não cremos no auge por renegarmos a decadência. O ser humano não fez o que ainda pode fazer. Uma nova maneira de observar e realizar as relações, o sexo, o amor acaba de florescer do betume obscuro do lodo da civilização. Uma parede vazia de significados, que espera por alguém que a construa sem um projeto arquitetônico, apenas seguindo a própria lógica do passo a passo.
Não há como apreender o roteiro da vida, pois o que passou deixou de existir, e o que virá não passa de falsa conjectura.
Prometeu finalmente se liberta, e agora doma a águia que lhe devorava o fígado, partindo para a reformulação da teoria do fogo, trazendo junto a si uma outra maneira de encarar o poder de manipulação do deus Volcano.
E não haverá derrotados, pois não haverá vitoriosos.
E o choro, quando vier, será filho de si mesmo, não uma consequência da inculcação da mente absurda do ser humano por sua falta de percepção da verdadeira face do Divino.
São Bento do Sul, 17 de fevereiro de 2001.
Tem que se ter bolas pra publicar poesia (sim, poesia) tão visceral.
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